Acabar com a corrupção é o objetivo supremo de quem não chegou ao Poder. Millôr Fernandes, morreu sem ver a sua expressão desmentida, ou contrariada por comportamentos mais éticos, depois de tantas roubalheiras denunciadas em operações do tipo "Mensalão" e "Lava-Jato".
Quem está no Poder, quer enriquecer-se e, quem está fora, almeja entrar. A revelação da fraude bilionária no INSS, expõe a ganância dos que não perdoam sequer o bolso de aposentados cegos, octogenários e analfabetos. Foram miseravelmente roubados em suas misérias por meio de descontos não autorizados nos benefícios.
Agora, cria-se uma guerra de narrativas, com o governo Lula pondo a culpa no período bolsonarista, e vice-versa. Divulgou-se que entre 2019 e 2024, os assaltos renderam R$ 6,3 bilhões distribuídos em propinas e rendas para sindicatos e associações que se dizem "de assistência e proteção dos direitos dos aposentados".
Foi afastado o presidente do INSS Alessandro Stefanutto e alguns diretores da área. Todos alegam ignorância dos fatos, embora 1,7 milhão de reclamações por descontos não autorizados tenham dado entrada no Instituto, até o primeiro semestre de 2024. O ministro da Previdência Carlos Lupi, que indicou Stefanutto, jura inocência e ainda defende o apadrinhado. Não vê motivos para deixar o governo. O presidente Lula, por sua vez, é refém do PDT, partido que Lupi representa e que faz parte da base governista no Congresso. Para quem não se lembra, Carlos Lupi foi ministro do Trabalho em 2020, no período Dilma Rousseff, e teve que sair depois de descobertos convênios irregulares com ONGs.
O sistema dos desvios de agora, tinha até um operador oficial, conhecido pelo codinome "Careca do INSS". Antonio Carlos Camilo Antunes é o nome dele. Nem servidor do Instituto ele é, mas tinha crachá e transitava tranquilo por todas as salas do andar nobre. Encaminhava os pedidos de convênio, providenciava a autorização dos descontos e depois distribuía as propinas - milhões de reais -, para servidores, esposas, filhos e irmãos daqueles que tinham caneta. Um deles foi apanhado em operação da PF com Ferrari, Rolls-Royce, Porsche e coleção de relógios de grife. O Careca tinha 22 empresas que movimentaram R$ 53,5 milhões. O dinheiro entrava e saía rapidamente, para manter as contas bancárias sem fundos. Tinha até um banco nas Ilhas Virgens, no Caribe, para guardar o produto dos seus 15 anos como lobista dentro do INSS. Lembra o caso de Jorgina de Freitas, considerada a fraudadora-mor do Brasil? Conseguiu desviar R$ 2 bilhões do INSS, no início dos anos 1990. Era considerado o maior esquema de desvio de verbas acidentárias e de aposentadorias forjadas. Ela empreendeu uma fuga internacional, foi presa, vivia como uma rainha na prisão e somente parte do dinheiro foi recuperado com a apreensão de bens. Sua pena foi de 14 anos de prisão, a mesma da moça do batom.
O irmão mais velho do presidente Luís Inácio Lula da Silva, por coincidência, é vice-presidente do Sinapi - Sindicato Nacional dos Aposentados e Pensionistas da Força Sindical. Frei Chico, como é chamado, tem 83 anos, mas ainda faz os seus milagres. A entidade que representa sequer precisou apresentar a documentação protocolar para firmar convênio com o órgão previdenciário. Também foi desobrigado de apresentar a biometria facial dos beneficiários que teriam autorizados os descontos no holerite. A receita do sindicato do irmão do Lula saltou 414%, com os descontos dos aposentados. Não há indícios de que Frei Chico seja alvo direto das investigações.
O INSS chegou a liberar descontos em folha à base de 1.500 autorizações por hora. Curioso que 1 milhão e 100 mil trabalhadores que aguardam na fila o auxílio doença, não mereçam padrão parecido de eficiência dos burocratas da Previdência. Quando os lesados serão ressarcidos? Nem o Haddad sabe.
O autor é jornalista.