Governo Trump diz que ordens de Moraes não têm efeito nos EUA

O governo Donald Trump, por meio do Departamento de Justiça dos Estados Unidos, afirmou ao ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), que quatro ordens proferidas pelo magistrado contra a rede Rumble não têm efeito em solo americano.
Para que elas pudessem valer, disse o órgão, o magistrado precisaria ter ingressado com uma ação em um tribunal dos EUA ou ter recorrido a canais legais.
A informação consta de documento encaminhado a Moraes, com cópia ao Ministério da Justiça do governo Lula (PT), ao qual a Folha de S.Paulo teve o. A notícia sobre a carta foi revelada pelo jornal The New York Times.
"Não tomamos posição sobre a aplicabilidade das várias ordens e outros documentos judiciais que direcionam a Rumble a agir dentro do território do Brasil, o que é uma questão de lei brasileira", diz a carta.
"No entanto, na medida em que esses documentos direcionam a Rumble a realizar ações específicas nos Estados Unidos, respeitosamente informamos que tais diretrizes não são ordens judiciais executáveis nos Estados Unidos", afirma o texto, assinado por Ada Bosque, diretora no Escritório para Assistência Judicial Internacional da Divisão Civil do departamento.
O Ministério da Justiça confirmou ter recebido a carta na terça-feira (27) e a encaminhado nesta sexta (30) ao setor responsável pela análise.
O órgão do governo dos EUA afirma que a carta foi motivada por informações prestadas pela Rumble, plataforma popular entre influenciadores da direita.
A empresa relatou ao departamento ter sido alvo de quatro ações judiciais em fevereiro, nas quais Moraes determinou o bloqueio de contas de um indivíduo (que seria o bolsonarista Allan dos Santos) e que suspendesse o ree de verbas a ele. "Essas supostas diretrizes são emitidas sob ameaça de penalidades monetárias e outras sanções", diz o documento.
"De acordo com o Direito Internacional Consuetudinário, um Estado não pode exercer jurisdição para executar no território de outro Estado sem o consentimento deste outro Estado", diz.
Em seguida, a carta informa que, para executar a sentença, "a pessoa que busca a execução geralmente precisaria iniciar processo judicial nos EUA".
"O tribunal dos EUA aplicaria a lei e determinaria se deve ou não conceder a medida solicitada contra uma parte sobre a qual tenha jurisdição. A legislação dos EUA prevê várias bases para a não homologação, que podem incluir a ausência de devido processo legal ou incompatibilidade com as leis norte-americanas que protegem a liberdade de expressão. As ordens judiciais brasileiras não são executáveis nos Estados Unidos sem o reconhecimento e o trâmite de execução bem-sucedidos naquele país", continua.
O departamento ainda afirma que, para que o ministro determine ações da Rumble no território brasileiro, o magistrado precisa enviar suas ordens por canais específicos previstos no direito internacional.
Cita os canais da Autoridade Central em acordos multilaterais, como o Tratado de Assistência Jurídica Mútua em Matéria Penal (MLAT) e as convenções de Haia, para a solicitação e execução de documentos ou provas.
Por fim, o departamento conclui a carta se colocando à disposição para prestar mais informações.
O Departamento de Justiça não respondeu a pedido da reportagem por comentários sobre a carta. O Ministério da Justiça confirmou à Folha de S.Paulo o recebimento do documento.
O advogado do Rumble, Martin de Luca, a quem a carta também foi encaminhada, afirmou que o documento reforça que as decisões de Moraes contra a plataforma são ilegais.
"As ações do ministro distorcem as práticas do Judiciário brasileiro", disse De Luca. O advogado ainda apontou o que vê como equívocos do governo brasileiro ao atrelar as medidas do governo americano direcionadas a Moraes como ataques à soberania do país. "É inissível que o governo brasileiro, na tentativa de evitar sanções ao ministro, foque no argumento de que ele age contra ameaças à democracia, em vez de lidar com o problema real, que são as ações ilegais do ministro", avaliou.
Além das decisões contra o Rumble, no ano ado Moraes chegou a suspender o X (ex-Twitter), de Elon Musk, que integrou a gestão Trump e anunciou sua saída na quarta-feira (28).
A revelação sobre a carta surge em meio à decisão do governo Trump de suspender vistos de quem a gestão considerar que censurou empresas e cidadãos americanos. Bolsonaristas e até alvos de determinações do ministro dizem acreditar que ele seria afetado pela iniciativa, anunciada na quarta-feira.
O deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) licenciou-se do cargo em março, ou a morar nos EUA e fez giros em Washington, advogando pela punição a Moraes.
Na noite de quinta-feira (29), o perfil do Escritório de Relações com o Hemisfério Ocidental, ligado ao Departamento de Estado, fez uma publicação em português brasileiro dizendo: "que fique claro: nenhum inimigo da liberdade de expressão dos americanos será perdoado".
Embora a suspensão de vistos anunciada pelo governo dos EUA seja uma das ações que podem atingir Moraes, a expectativa de Eduardo é que ainda saia uma medida específica direcionada ao ministro do STF.
Seria a de um decreto por Trump para aplicar punições da chamada Lei Magnitsky, que prevê sanções a pessoas acusadas de violação de direitos humanos e corrupção.