Região Metropolitana de Piracicaba: demagogia ou algo pra valer?

Por Professora Bebel |
| Tempo de leitura: 6 min

O governo do Estado de São Paulo protocolou no último dia 21 de junho do corrente ano Projeto de Lei Complementar (PLC 22) instituindo a Região Metropolitana de Piracicaba, o qual havia sido anunciado com pompa e circunstância pelo Governador Dória em visita a Piracicaba no dia 18 do mesmo mês.

Trata-se de uma medida correta, pois vai na direção de promover a descentralização da gestão istrativa do Estado e impulsionar o desenvolvimento regional, e deveria ser recebida com júbilo não fosse o histórico anterior de absoluto descaso e abandono por parte do governo estadual e dos governos municipais, em sucessivas gestões, do arranjo trazido pela institucionalização, em 2012, da Aglomeração Urbana de Piracicaba (Lei Complementar 1.178, de 26/6/2012).

Com efeito, desde 2012, decorridos, portanto, quase dez anos, a região já ara a contar com um arcabouço institucional adequado para impulsionar o desenvolvimento regional e, graças à incompetência, descaso e inércia dos governos estaduais e municipais desde então, aquilo que poderia ser celebrado como um extraordinário avanço não ou de mera promessa demagógica, pois nada aconteceu de relevante para dar forma e conteúdo ao instituto da Aglomeração Urbana criado. O Conselho de Desenvolvimento previsto para ser instalado ainda no decorrer daquele ano de 2012, não o foi. O Conselho Consultivo, igualmente, não o foi. E o principal instrumento criado pela LC 1.178, que é o Plano Regional de Desenvolvimento, apenas em setembro de 2017 foi tornado público, quando a EMPLASA abriu uma plataforma para receber sugestões para a sua estruturação, estabelecendo-se então o prazo de 1º de março de 2018 para que tais sugestões fossem apresentadas. E esse Plano foi concluído? E foi aprovado pela Conselho de Desenvolvimento? E é de conhecimento público? Nem uma coisa e nem outra. Zero.

Ou seja, a Aglomeração Urbana de Piracicaba se constituiu num rotundo fracasso, mercê, repito, do descaso e da incompetência dos sucessivos governos estaduais e municipais ao longo de quase dez anos. O Parlamento Regional da Aglomeração Urbana de Piracicaba - PRAUP, que congrega os representantes do poder legislativo regional, foi criado dias atrás e, apesar de tardiamente, é um fato pelo menos auspicioso.

Mas não é apenas a região de Piracicaba que tem pagado esse preço. Se examinarmos o que tem ocorrido nas demais regiões, seja as que conformam aglomerações urbanas, seja as que conformam regiões metropolitanas, o fracasso é semelhante. Aqui e ali acontece algo de alguma relevância, mas não tem sustentabilidade, não para de pé, pois o próprio governo estadual não acredita no processo de desenvolvimento urbano-territorial. Vejamos o absurdo. Em maio de 2019, o Governo Dória extingue a EMPLASA, que era o órgão encarregado de dar e técnico às regiões metropolitanas e aglomerações urbanas, realizando diagnósticos e liderando a elaboração dos planos de desenvolvimento. Esse papel e todo o acervo da EMPLASA migraram para a Secretaria de Governo e Secretaria de Desenvolvimento Regional, que não têm estrutura e nem competência institucional para tal responsabilidade.

A institucionalização, portanto, da Região Metropolitana de Piracicaba traz a dúvida procedente: pirotecnia demagógica ou é para valer?

Na Exposição de Motivos do PLC 22, à guisa de justificar a medida, o governador menciona a realização de audiência pública no dia 8 de maio de 2021, dando a entender que os poderes públicos municipais e a sociedade em geral, representativos dos 25 municípios envolvidos, reunidos nessa audiência, deram um aval consistente ao projeto. Perguntas: essa audiência aconteceu mesmo e, se aconteceu, teve uma representatividade robusta? Bem, aqui em Piracicaba, salvo melhor juízo, não teve impacto algum, pois a sociedade em geral não ficou sabendo de sua realização e, portanto, não se mobilizou.

Apesar dessa tíbia sustentação política, o governo estadual protocolou o PLC 22 na Assembleia Legislativa em regime de urgência, querendo ar à sociedade a impressão de que tem pressa. Contudo, conforme se verifica no parágrafo único do artigo 4º desse PLC, as estruturas da governança interfederativa - a saber, Conselho de Desenvolvimento, Comitê Executivo e Entidade Autárquica - não foram criadas nessa oportunidade, postergando-se essa providência para um futuro Projeto de Lei Complementar, ficando sem definição quando isso ocorrerá. Por que não se concluiu primeiramente a preparação completa da matéria, detalhando-se referidas estruturas de governança, que são chaves para o efetivo funcionamento da Região Metropolitana de Piracicaba, antes de enviá-la à Assembleia?

Curiosamente, em 20 de maio último, portanto há apenas um mês atrás, o governo estadual encaminhou o PLC 15 para criar a Região Metropolitana de São José do Rio Preto e nele o texto sobre a governança interfederativa guarda muita diferença com o do PLC 22, relativo à Região Metropolitana de Piracicaba. No caso de São José do Rio Preto, por exemplo, há um detalhamento das estruturas da governança interfederativa, ao o que no caso de Piracicaba inexplicavelmente remete-se esse detalhamento para um futuro PLC. No caso de São José do Rio Preto, o Conselho de Desenvolvimento não prevê a participação da sociedade civil, prevendo-a apenas no âmbito do Conselho Consultivo. No caso de Piracicaba, corretamente, a meu ver, prevê-se a participação da sociedade civil no Conselho de Desenvolvimento e não existe a previsão do Conselho Consultivo. Durma-se com um barulho desses. Por que essa discrepância de tratamento para projetos da mesma natureza e objeto? Ou se trata de mero bate-cabeça nos âmbitos técnico e decisório do governo do estado ou é malabarismo diversionista para dificultar a implementação de ambos os projetos. Ou ambas as coisas.

Ciente dessa eventual manobra, protocolei emenda ao PLC 22, no capítulo das Disposições Transitórias, colocando prazo de 90 dias, a contar da data da sua promulgação, para que o Poder Executivo Estadual encaminhe ao Poder Legislativo Estadual a proposta de dispositivo legal que criará as estruturas de governança interfederativa, conforme prevê o parágrafo único do artigo 4º daquele PLC. Avaliei que sem a exigência de prazo, o governo estadual procrastinará indefinidamente essa matéria tão relevante para o real funcionamento da Região Metropolitana de Piracicaba.

Apresentei outra emenda ao PLC 22, incidente no mesmo artigo 4º, que autoriza o Poder Executivo Estadual a constituir Consórcio Público, em conjunto com os municípios integrantes da Região Metropolitana de Piracicaba, nos termos da lei federal 11.107, de 6 de abril de 2005. Tal medida, se aprovada, criará condições para que a Região Metropolitana de Piracicaba alcance maior robustez e eficácia institucional e operacional na governança interfederativa.

Estou convicta de que a Região Metropolitana de Piracicaba deve ser criada e vou lutar na Assembleia Legislativa pela sua aprovação, com os aperfeiçoamentos que propus e outros que surgirem no curso dos debates naquela Casa, pois é uma exigência de governança istrava necessária ao desenvolvimento urbano integrado regional.

Adotei uma postura crítica diante dessa matéria e procurei expressá-la aqui, com vistas a impedir que a sociedade seja iludida pela demagogia e veja escapar pelas mãos, mais uma vez, algo tão importante para o seu desenvolvimento. Não descansarei um minuto e não darei trégua até que tenhamos a certeza de que o projeto ganhou a sua materialidade necessária e definitiva.

Professora Bebel é deputada estadual, presidenta da Apeoesp e líder da bancada do Partido dos Trabalhadores na Assembleia Legislativa de São Paulo

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